Os Anjos das nações

Os Anjos das nações “Naqueles dias, ergui os olhos e tive uma visão: Era um homem vestido de linho, que tinha à cintura uma faixa de oiro fino. O seu corpo era semelhante ao topázio, o rosto tinha o aspeto do relâmpago; os olhos eram como tochas de fogo, os braços e as pernas brilhantes como bronze polido, e o rumor das suas palavras, como o rumor duma multidão. Ele falou-me assim: «Não temas, Daniel, pois as tuas palavras foram atendidas, desde o primeiro dia em que tomaste a peito compreender, e ainda humilhaste-te perante o teu Deus. Vim aqui por causa das tuas palavras. O Príncipe do reino da Pérsia, fez-me frente durante 21 dias. Então, Miguel, um dos chefes principais, veio em meu auxílio. Eu deixei-o a fazer frente ao Príncipe dos reis da Pérsia, e vim para te explicar o que vai acontecer ao teu povo, nos últimos dias... Vou dar-te a conhecer o que está escrito no livro da verdade. Devo regressar à luta contra o Príncipe da Pérsia. Quando acabar esta luta, surgirá o Príncipe da Grécia. Ninguém me ajuda nestes trabalhos a não ser Miguel, o vosso Príncipe»” (Dn. 10, 2a. 5-6.12-14.21-23).
Esta passagem da Escritura que acima está transcrita, é a primeira leitura da memória do dia 10 de Junho, Missa própria em honra do Anjo da Guarda de Portugal, que se fundamenta na convicção que a Tradição nos apresenta de que cada nação tem o seu Anjo Custódio.


Fundamento Bíblico
Acerca desta realidade dentro dos ministérios angélicos, o Novo Catecismo dá-nos esta explicação, que não deve ser ignorada. “Desfeita a unidade do género humano pelo pecado, Deus processou, em primeiro lugar, salvar a humanidade através de cada uma das suas partes. A aliança com Noé, a seguir ao dilúvio (cfr. Gn. 9,9,), exprime o princípio da economia divina em relação às «gentes» ou nações, quer dizer, em relação aos homens reagrupados segundo os seus países, cada qual segundo a sua língua e os seus clãs (cfr. Gn. 5; 10, 20-31). Esta ordem, ao mesmo tempo cósmica, social e religiosa, da pluralidade nas nações (cfr. Act. 17, 26-27), confiada pela Providência Divina à guarda dos Anjos (cfr. Dt. 4, 19; 32, 8), destinou-se a pôr cobro ao orgulho duma humanidade decaída, que, unânime na sua perversidade (cfr. Sab. 10, 5), pretendia refazer por si mesma a própria unidade, à maneira de Babel (cfr. Gn. 11, 4-6)” (Cat. Ig. Cat. nº 56 e 57).
A universalidade das Alianças antes da realizada com Abraão, Deus a concretizará plenamente em Seu Filho. Na nova e eterna Aliança, ficarão englobadas definitivamente todas as nações, todos os povos, línguas e raças. Contudo Deus nunca abandonou a obra das Suas mãos, ou seja, as outras nações fora de Israel, povo de Deus da primeira Aliança. A Sua Providência entregou-as ao cuidado dos Seus Anjos. Ao longo do Antigo Testamento São Miguel é apresentado como um dos principais guardiães do povo judeu. É chamado “Príncipe do vosso povo”, conforme o diálogo de S. Gabriel com o profeta Daniel. É precisamente com este profeta que se fortalece esta crença, numa hora histórica dificílima do povo hebreu, quando estava no exílio e subjugado entre os gregos e persas, e depois libertados da escravidão por um decreto de Ciro.
Todavia o tão suspirado regresso à pátria era impedido por dificuldades misteriosas. Quem mais se afligia com tais demoras era o profeta Daniel, que a Deus fazia contínuas súplicas. Um dia, enquanto repousava nas margens do rio Tigre, apareceu-lhe o Arcanjo S. Gabriel a anunciar-lhe que as suas preces iam ser ouvidas. Mas, acrescentou que o Anjo protetor da Pérsia não acedia a deixar partir os Hebreus em liberdade, opunha-se mesmo a isso. “O Príncipe do reino da Pérsia resistiu-me durante 21 dias” (Dn. 10, 13); e a ele se aliara, pouco antes, o anjo protetor da Grécia (cfr. Dn. 10, 23). Não obstante, muito em breve Gabriel combateria esta resistência, fortalecido desta vez pelo apoio de Miguel: “Para tal empresa ninguém virá em meu auxílio, exceto o vosso chefe Miguel” (Dn. 10. 20-21).

Testemunhos na vida da Igreja
A importância e o valor destes testemunhos são consideráveis. A guarda angélica dos povos é doutrina consoladora, da qual jamais duvidaram os insignes exegetas da Escritura e os Padres e Doutores da Igreja; doutrina de que tiraram proveito não só os profetas como também os Santos e os Apóstolos.
São Francisco Xavier nela afirmava as maiores esperanças de evangelização do Japão. Assim escrevia o Apóstolo das Índias aos seus Irmãos de Goa: “Vivo com a enorme esperança de que Deus me concederá a graça da conversão deste país, porque, desconfiado de mim mesmo, pus toda a minha confiança em Jesus Cristo, na SSma. Virgem Sua Mãe e nos nove Coros dos Anjos, de entre os quais escolhi para protetor o Príncipe da Igreja Militante São Miguel. Muito espero deste Arcanjo a cujo particular desvelo foi confiado este grande reino do Japão. Todos os dias a ele me encomendo de modo particular, assim como a todos os Anjos da Guarda dos japoneses” (cfr. Bartoli, Dell’Asia, livr. III; cfr. P. A. Ferrati, I Santi Angeli Custodi).
Recorrendo a escrito de santos, temos testemunhos de intervenções em revelações privadas do Anjo Custódio do Reino na história do seu povo. Por exemplo na Irlanda: “Conta-nos o Venerável Beda que um dos reis da Irlanda tinha grande devoção aos Santos Anjos, e costumava orar-lhes com fervor. Teve, porém, um mau conselheiro, e começou a malquistar-se com os seus súbditos, pelo que estes se juntaram contra ele, resolvidos a moverem-lhe guerra. Ao saber disto, o Rei ficou inquieto; mas eis que lhe apareceu o seu Anjo da Guarda, que lhe disse: «Não temas. Pela devoção que sempre me tens tido, assim como aos outros Anjos, obtivemos de Deus que os outros príncipes e teus súbditos se decidissem a fazer aliança contigo. Mas, por teu lado, tens de afastar de ti esse mau conselheiro, e esforça-te por contentar os bons homens do teu reino», o que fez o rei, com ótimos resultados”.
Também no tempo do rei Olíbrio da Hungria, este saiu-se bem num episódio do seu reinado, graças à intervenção do Anjo da Guarda do seu Reino. Em memória desse acontecimento mandou fazer grandes solenidades em sua honra e pôs a sua imagem sobre a sua coroa. Daí por diante tornou-se costume dos reis e príncipes da Hungria invocarem nas ocasiões solenes a Deus, por intermédio do seu Anjo, e nada resolviam de grave sem terem feito esta oração (cfr. Os Santos Anjos, por E. D. M., Tipografia Inglesa Lda., Lx, 1954, pg. 10 e 11).

Sou o Anjo da Paz
Na História da Igreja deste século encontramos um testemunho claro desta realidade dos Anjos das nações. As aparições da Mãe de Deus em Fátima foram precedidas pelas do Anjo: as silenciosas de março a outubro de 1915; e as três dialogadas em 1916.
Não foi um Anjo qualquer, mas um especial, como ele próprio se chamou. Na primeira aparição, na primavera de 1916, cognominou-se pela sua tarefa específica: “Não temais. Sou o Anjo da Paz. Orai comigo”. Mas na segunda foi mais claro ao revelar-se: “De tudo o que puderdes oferecei um sacrifício em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido e de súplica pela conversão dos pecadores. Atraí assim sobre a vossa Pátria a Paz. Eu sou o Anjo da sua Guarda, o Anjo de Portugal”.
As aparições silenciosas do Anjo, dão-nos uma visão de conjunto de toda a revelação de Fátima. Está ali, de facto, uma tríplice mensagem:
a) pureza de vida, ou vida em graça, que é “o que Nossa Senhora quer”. As aparições começaram no primeiro dia em que Lúcia vai guardar o rebanho com as companheiras que a Sra. Maria Rosa propositadamente escolhera para acautelar a saúde moral da filha. Na véspera fora para a serra com os restantes pastores e veio de lá desanimada com o ambiente pagão que encontrou. Por isso, a mãe procurou companheiras de toda a confiança. Foi exatamente nesse dia (provavelmente 24 março) que o Anjo apareceu pela primeira vez.
b) terço: o Anjo aparece quando rezam o terço, mantém-se visível enquanto o terço perdura, e desaparece logo que este termina.
c) ato de Fé: os videntes compreendem que o personagem da aparição não é deste mundo. Não sobe da terra, não desce para ela e mantém-se, suspenso no ar, contra as leis físicas. Há, portanto, um outro mundo (ato de Fé, em miniatura). Ora, a mensagem de Fátima, começa por um ato de Fé. O primeiro pedido que o Céu faz à Terra, na Loca do Cabeço, é esta oração: “Meu Deus, eu creio...”

Oração
O Anjo ensina duas fórmulas novas de oração. A primeira – “Meu Deus, eu creio...” – contém todos os atos reduzidos à expressão mais simples, por vezes, a uma só palavra. Oração perfeitamente adaptada ao século XX (é cada vez menor o tempo reservado à oração) e oportuníssima para qualquer momento do dia. Oração universal: nela pedimos por nós e por todos. A segunda – “Santíssima Trindade...” – constitui uma bela preparação e uma excelente ação de graças da Missa e da Comunhão. Contém, além disso, de maneira muito clara e ordenada, os quatro elementos teológicos da oração perfeita: adoração, oferta, reparação e petição.
O Anjo pede oração contínua: “Oferecei constantemente ao Altíssimo, orações...”. Isto é viver em união com Deus, elevando continuamente a alma até Ele.
O Anjo convida-nos a rezar com Ele: “Orai comigo”. A união com o Anjo, que vive permanentemente na visão beatífica, torna mais intensa e perfeita a nossa oração.

Penitência
Significa aceitação do sofrimento que Deus envia. “Sobretudo aceitai e suportai, com submissão, o sofrimento que o Senhor vos enviar”. Significa também, cumprimento dos deveres de estado (implícito no pedido anterior, uma vez que os deveres próprios são a expressão mais direta e clara da vontade de Deus); e conversão de toda a vida em sacrifício, isto é, em oferta constante ao Senhor: “Oferecei constantemente ao Altíssimo... sacrifícios”. Tudo o que é de acordo com a vontade divina pode ser objeto de oferta a Deus, quer agrade quer desagrade a nossa sensibilidade.

Eucaristia
O Anjo adora a Eucaristia e leva os videntes a adorá-la consigo (prostração e oração eucarística). Recomenda a receção da Eucaristia: “Tomai e bebei o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo”. Pede a Eucaristia como meio de reparação: “Reparai os seus crimes (dos homens) e consolai o vosso Deus”.

Paz de Portugal
Na aparição do Poço do Arneiro há uma mensagem direta em ordem à paz da nossa Terra. “Atraí assim a paz para a vossa Pátria. Eu sou o Anjo da sua Guarda, o Anjo de Portugal”. Segundo a revelação do Anjo, a Paz de Portugal exige: a oferta de tudo o que fazemos, em reparação; e a dinâmica desta oferta: cumprimento mais exato dos deveres próprios: perfeição maior de todas as ações. A equação do problema da Paz em Portugal é, naturalmente, válida para qualquer outro país. O cumprimento dos deveres é, em toda a parte, caminho e condição da ordem e, portanto, da Paz.

Ecumenismo
Não podemos deixar de considerar relevante a dimensão ecuménica da aparição do Anjo no recurso simultâneo à liturgia romana (comunhão de Lúcia só com o Pão) e bizantina-eslava (comunhão de Jacinta e Francisco com o Vinho, prostração, etc...) (cfr. Diálogos de Fátima, M. Dias Coelho, 1977, Sameice, pg. 6 e 7).

Como poderemos aumentar à nossa volta a lembrança e a devoção ao Anjo da nossa Pátria?
1°- Convidamos todos a que, deste dia em diante, rezem diariamente um Pai-Nosso, Avé-Maria e Glória ao Anjo Custódio de Portugal pelas suas intenções e pela nossa Pátria. Em recompensa, o Santo Anjo alcançará as maiores graças.
2°- Cada um deveria ter uma estampa deste Anjo. Assim se lembrará mais constantemente dele.
3°- Que consolação seria ver uma imagem do Anjo de Portugal em mais igrejas...

Oração Final
“Deus eterno e omnipotente, que destinastes a cada nação o seu Anjo da Guarda, concedei que, pela intercessão e patrocínio do Anjo de Portugal, sejamos livres de todas as adversidades. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, Vosso Filho, que é Deus conVosco na unidade do Espírito Santo!” (cfr. Oração Coleta da Missa de 10 de Junho: Santo Anjo da Guarda de Portugal).